Pêlos e Padrões

Então é isso, penso que sempre estive na corda bamba, nunca conseguindo me equilibrar; apreciando minhas duas pernas de pêlos curtinhos (uma vergonha, porque o indicado mesmo seria adquirir o Novo! Veet); apreciando a fúria serena da escrita orgânica, estigma polivalente no ápice do clichê foulcaultiano farto de esteriotipagem... enquanto se usa muito de um tudo.

Querendo ser mais anônima e “antônima” do que se é permitido neste cotidiano que vejo e que me vê.

Imagine você mulher, num mercado escolhendo verduras - especialmente verduras, já que os produtos industrializados estão dispostos em corredores para que compremos em fila, enquanto marketeiros e capitalistas se certificam que assim veremos tudo o que devemos ver e mais, que haverão produtos em embalagens iguais pra todo mundo, contanto que estejam dentro do padrão exigido por órgãos tipo o Inmetro, tipo a própria sociedade cismada em “padrões”, que não deixa de ser um órgão público gigante.

Porém, na seção hortifruti, verduras quase podres, murchas e amassadas que são entregues em caixas de madeira ou plástico e empilhadas são aceitas, cabe a nós escolhermos quais comprar. Aliás, estou falando disso mesmo, escolha, padrão, rótulos, pessoas-produtos que se materializam no que comem, nos bens que adquirem... Então, a tarefa é justamente “escolher” e lá está você, mulher, escolhendo verduras (foi aqui que paramos). De cabeça baixa você, consumidora, diz para a maravilhosa mulher ao seu lado: “Amor, vamos levar beterrabas!”, e quando você levanta a cabeça, à sua frente está aquele seu cliente ou seu chefe, passado, achando você muito moderna e fingindo que não ouviu a ‘nome próprio’ “Amor” e muito menos os olhos de ternura muito mimosos da mulher maravilhosa ao seu lado que dizia: “Não, por favor, princesa, beterraba não!”

¬¬

Historinha pra ilustrar a grande questão da atual corda bamba cotidiana: ser reconhecido o tempo todo! Você, lésbica, sem máscaras, com a sua mulher escolhendo verduras; sendo de verdade o que se é, não necessariamente dentro da realidade que se vivencia cotidianamente por sobrevivência, ou para poupar assunto. Sim, sinto certa preguiça das pessoas. De como são e como pensam... Fato é que eu sobrevivo de beterrabas e vivo de amor lésbico. Raspo pêlos diários com gilete, e paciência para crescer! (Fui ao mercado e não me tornei uma consumidora Novo! Veet. Meu cotidiano não está na rota de fornecimento).

Portanto, casa... (suave e doce casa-abraço). O equilíbrio da corda bamba cotidiana está dentro de casa. Lá fora onde me vêem, me vêem mesmo. O costume ensina que esses tecem... tecem tanto! E ressalto que não se trata apenas de encontrar pessoas do meio empregatício, assalariado em locais públicos. Cito como modelos de caso de “comentário” em cidades pequenas. O sentido de “corda bamba” é maldade e preconceito das pessoas.

E já senti que enfrentar dói. Os olhos locais cotidianos ferem.
Então eu penso onde vivi e onde estou. Sinto um remorso estranho, um descontentamento...

Comentários

  1. Gosto de gente assim,
    Que fale bem,
    que ama muito,
    que seja doce...
    tenra e forte
    louca e pura.
    Admiro com todos porques.
    Um beijo da sua amiga Grazy

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  2. Viajei no seu texto! Senti na alma!

    lindooo

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